
O Annapurna I foi a primeira montanha com mais de 8000 metros a ser escalada na história do alpinismo, no ano de 1950, por uma expedição francesa, liderada por Maurice Herzog. Equipados com cerca de 150 carregadores, os franceses foram os primeiros ocidentais a subir o vale do Kali Gandaki. Após explorar a região do Dhaulagiri (uma outra montanha com mais de 8000m, vizinha ao maciço do Annapurna), eles decidiram voltar suas atenções ao Annapurna. Assim, eles subiram pelo vale do Miristi Khola, escalaram a montanha pela face norte, chegaram ao cume no dia 3 de junho e voltaram com severos congelamentos. O Annapurna é a décima montanha mais alta do mundo e uma das mais difíceis e perigosas, dentre as montanhas com mais de 8000m.
Desde 1986 a região está protegida pelo “Annapurna Conservation Area Project” (ACAP) e, atualmente, conta com diversos trajetos de trekking, dentre os quais destacam-se o Annapurna Sanctuary e o Annapurna Circuit. A caminhada do Annapurna Sanctuary dá acesso ao acampamento base da via normal de escalada do Annapurna I. E o Circuito do Annapurna é uma caminhada que atravessa toda a face norte do maciço. Os trajetos destas caminhadas passam por diversos vilarejos e estes possuem vários lodges, guesthouses e restaurantes (não sendo, portanto, necessário levar barraca e equipamento de camping).
A caminhada do Annapurna Sanctuary porporciana vistas do Annapurna I (8091m) e do Machhapuchhare (6997m), entre outros. Já do Circuito do Annapurna não é possível visualizar estas montanhas, e sim outras, tais como o Annapurna II (7937m), Dhaulagiri (8167m) e o Manaslu (8156m), entre outros.
Considerando que já estávamos no mês de junho, quando inicia-se o período de monção, com chuvas torrenciais vindas do sul, decidimos não fazer o trekking do Annapurna Sanctuary. Esta caminhada está na face sul do maciço e é bastante atingida pelas chuvas nesta época do ano. Já o Circuito do Annapurna, por estar predominantemente no lado norte do maciço, tem um clima mais seco. As nuvens que vêm do sul, ao encontrarem a cadeia de montanhas do Annapurna, descarregam toda sua umidade na forma de chuva e neve. Assim, ao chegarem no lado norte do maciço, elas já estão mais secas. Portanto, desta forma tem-se um clima semi-árido no lado norte da cadeia.
Nos dias que estivemos em Pokhara, tramitamos a burocracia necessária para fazer este trekking.
- DICA: Assim como na região do Everest e também outras do Nepal, é necessário tirar um cartão chamado TIMS (Trekking Information Management System), que custa 20 dólares. O TIMS pode ser feito em Pokhara ou em Kathmandu. Em Pokhara ele deve ser feito no Annapurna Conservation Area Project Office, no bairro Damside (numa pequena travessa da avenida Simalchaur). E em Kathmandu, no Tourist Service Centre (na rua Pradarshanti Marg; Bhrikuti Mandap).
Além do TIMS, para caminhar na região do Annapurna, deve-se pagar uma taxa de entrada da área de conservação, que custa 2000 rúpias (aproximadamente 28 dólares). Essa taxa pode ser paga também no ACAP Office (em Pokhara) ou no Tourist Service Centre (em Kathmandu), ou então na própria guarita de entrada da área de conservação do Annapurna, durante a caminhada. Porém, cuidado: este valor é válido somente quando se paga a taxa antecipadamente, ou seja, em Kathmandu ou Pokhara. Caso você deixe para pagar a taxa na hora, na guarita de entrada da área de conservação, o valor será 4000 rúpias. Portanto, é melhor acertar toda a burocracia antes, enquanto você estiver na cidade.
Normalmente, o Circuito do Annapurna se inicia numa cidade chamada Besi Sahar e percorre o trajeto no sentido anti-horário, atravessando o lado norte das montanhas do Annapurna de leste para oeste. Porém, nós decidimos fazer a caminhada do lado contrário. Muito pouca gente faz a caminhada neste sentido, devido ao passo de 5416m (o Thorung La), trecho mais difícil do Circuito, que é mais complicado de ser cruzado de oeste para leste do que de leste para oeste.
Poucos anos atrás, foi construída uma estrada de terra que sobe até o início da região do Mustang, passando pela cidade de Jomsom e chegando até Muktinath. Antigamente este trecho era percorrido a pé, consistindo na parte final do Circuito do Annapurna (para quem segue o sentido normal). Atualmente, com a existência da estrada, este trecho perdeu parte do encanto, tornando-se um pouco monótono de se fazer caminhando pela estrada.
Portanto, como íamos fazer o circuito no sentido inverso, o início da nossa jornada se daria por um longo trajeto de estrada. Nossa idéia era chegar com transporte até o vilarejo de Jomsom e, a partir daí, começar a caminhar.
Dia 1 (06/06/2010):
Em Pokhara (880m), pegamos às 7:00 da manhã um ônibus rumo à Beni, onde chegamos por volta do meio dia. Após uma longa e desgastante negociação, pegamos um carro que nos levou até o vilarejo de Ghasa (2000m). Foram umas 3 horas de subida, por uma estrada de terra, lama e cascalho. Bastante ruim.
Já era final de tarde e, então, decidimos dormir em Ghasa mesmo. Assim. nos hospedamos no Old Mustang Guesthouse (100 rúpias o quarto para duas pessoas).
- DICA: Para quem quer fazer o Circuito do Annapurna no sentido contrário, como nós fizemos, ou para quem quer simplesmente conhecer a região do Lower Mustang (Jomsom, Kagbeni, Muktinath, etc.) é necessário pegar um ônibus de Pokhara até Beni. Este ônibus sai da Baglung Bus Station, em Pokhara, e custa em torno de 220 rúpias (1 dólar vale 72 rúpias). São aproximadamente 5 horas de viagem. Chegando em Beni, deve-se pegar um micro-ônibus, um jeep ou um taxi até Ghasa. O micro-ônibus custa 500 rúpias, o jeep custa 600 rúpias e o taxi deve-se negociar o preço. No nosso caso, por exemplo, conseguimos dividir um taxi entre 4 pessoas, por 2200 rúpias (portanto, 550 rúpias para cada um). De jeep ou taxi a viagem leva umas 3 horas e de micro-ônibus são umas 4 horas. Chegando em Ghasa, há micro-ônibus que sobem até Jomsom (600 rúpias por pessoa; 4 horas de viagem).
Para quem quer fazer o Circuito no sentido normal, é necessário pegar um ônibus até a cidade de Besi Sahar. Em Pokhara, deve-se pegar o ônibus na Main Bus Station. O ônibus grande custa 200 rúpias e o micro-ônibus (mais confortável) custa 220 rúpias. De micro-ônibus são umas 4 horas de viagem e de ônibus grande são 5 horas. Já para quem está em Kathmandu, deve-se pegar um micro-ônibus no Gongabu Bus Park (350 rúpias; 6 horas de viagem até Besi Sahar).
Dia 2 (07/06):
Acordamos cedo e partimos de Ghasa. Pegamos um micro-ônibus para Jomsom (2760m), onde chegamos depois de umas 4 horas de viagem, por uma estrada bastante precária. Finalmente, então, colocamos nossos pés no chão, mochila nas costas e iniciamos a caminhada. De Jomsom andamos, seguindo ainda pela estrada de terra, num trajeto um pouco monôtono, até o vilarejo de Kagbeni (2840m). Subia um vento fortíssimo pelo vale, o que é bastante comum nesta região na parte da tarde. Uma poeira infernal.
Como um oasis no meio de uma paisagem árida e varrida pelo vento, Kagbeni é um povoado encantador, de aparência medieval. Está numa região conhecida como Mustang. E é a porta de entrada para o Upper Mustang, uma área de acesso restrito para estrangeiros, onde é necessária uma permissão especial (e cara) para visitar.
Nos hospedamos no Shangrila Guesthouse (100 rúpias o quarto para duas pessoas, com banheiro dentro e chuveiro de água quente!) e saímos para passear um pouco pelo vilarejo de Kagbeni. Depois de andar bastante, passando por alguns “túneis” (passagens entre as casas medievais) nas ruelas estreitas do vilarejo, tirar várias fotos das pessoas do local, etc., voltamos para nosso confortável lodge, jantamos e fomos dormir.
Dia 3 (08/06):
Decidimos passar o dia conhecendo melhor a região de Kagbeni. Assim, fizemos uma caminhada até um pequeno vilarejo chamado Tiri, um pouco ao norte de Kagbeni. Tiri é o último povoado do Mustang onde é possível chegar sem a permissão de área restrita Ou seja, basta a permissão normal de trekking da região do Annapurna. Assim, aproveitamos a oportunidade para nos adentrarmos um pouco mais no vale do rio Kali Gandaki, rumo ao Upper Mustang, até onde nos era permitido.
Atualmente, é considerado oficialmente como Mustang, todo o distrito ao longo do vale do Kali Gandaki, desde Ghasa até a fronteira com o Tibet. No entanto, no uso comum, Mustang refere-se à região árida, de aparência tibetana, na parte norte do vale. Essa região é chamada de Lo por seus habitantes. E o povo deste lugar chama-se Lopa, que significa literalmente “pessoas de Lo”. A origem da palavra Mustang provavelmente vem de uma má pronunciação pelos nepaleses (de outras regiões do Nepal) da cidade de Manthang, capital de Lo. Assim, aqui a palavra Mustang não tem nada que ver com o automóvel ou com os cavalos selvagens.
Lo é um antigo reinado himalaiano, de cultura budista tibetana, que atualmente ainda guarda tesouros intocados pelo turismo em massa. Os nepaleses se referem a esta região (a partir de Kagbeni, rumo ao norte, até a fronteira com o Tibet) como Upper Mustang, a parte alta do vale, onde é necessário uma permissão especial e cara para entrar. Porém, apesar da alta taxa (de 500 dólares para 10 dias) para entrar no Upper Mustang (ou Lo), cada vez mais turistas tem visitado a região. As regulamentações antigas limitavam o número máximo de visitantes em 200 por ano e, posteriormente, 1000 por ano. No entanto, esta regulamentação tem sido ignorada e nos anos recentes a região recebe em torno de 3000 turistas por ano. Somando-se a isso, atualmente a estrada que vem pelo sul já está chegando em Kagbeni e há também uma estrada que vem pelo norte, ligando o Tibet até a cidade de Manthang. Um projeto em andamento prevê em breve ligar as duas estradas, de forma que toda a região estará cortada por uma estrada. Assim, o Mustang tem passado por grandes mudanças. E o futuro trará mudanças ainda maiores, colocando em risco a preservação desta frágil cultura.
Em Kagbeni, cruzamos o rio por um ponte suspensa e seguimos no rumo norte até Tiri. Em Tiri fomos conhecer a Sumdu Choeden Gompa, um pitoresco monastério, localizado no topo de um morro, acima do vilarejo. O lugar é fantástico! Parece perdido no tempo.
Após conhecer Tiri, caminhamos de volta para Kagbeni. O vento já havia começado a soprar. Rotineiramente, o vento começa no final da manhã (pelas 10:00 ou 11:00), vindo do sul, subindo o vale, e segue forte até o final da tarde.
Depois de almoçar em nosso lodge, caminhamos novamente pelo vilarejo de Kagbeni.
Depois de conhecer Tiri, caminhamos de volta para Kagbeni:
Passamos mais um noite em Kagbeni. O dia seguinte (09/06) amanheceu com o tempo lindo. Nos despedimos de Kagbeni e seguimos nossa caminhada.
Para ver as demais postagens sobre esta caminhada, clique nos links abaixo:
Annapurna Circuit (Parte 2)
Annapurna Circuit (Parte 3)
Annapurna Circuit (Parte 4)
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